Num passado recente, o desenvolvimento económico e social de alguns países, foi marcado por fenómenos associados à urbanização, industrialização e terciarização crescentes. No entanto, apesar das vantagens económicas a ela associadas, muitos impactos negativos se fizeram sentir ao nível do desenvolvimento humano, porque as formas de trabalho e de sociabilização que lhe estão ligadas conduzem, muitas vezes, à alienação do ser humano. Já o turismo é uma atividade económica construída tendo na base as pessoas e sendo desenhada e pensada para elas, dependendo o seu sucesso da qualidade das relações humanas. Em suma, o turismo, favorece a conexão entre pessoas, os encontros, a interação social e humana, o que representa uma importante mais-valia para o estabelecimento de vínculos de humanidade.
A Organização Mundial de Turismo (OMT/UNWTO), ao definir como tema para o “Dia Mundial do Turismo”, deste ano, Turismo e Investimentos Verdes, dá grande destaque a esta dimensão que, para a Pastoral do Turismo – Portugal (PTP), é de grande monta e a qual temos vindo a destacar: ou seja, a relação entre esta indústria, os investimentos nela feitos e as pessoas que por ela são envolvidas (empresários, agentes diversos, turistas) são vetores fundamentais e decisivos para o crescimento e desenvolvimento futuros. Mas, no contexto do turismo religioso e para os fiéis, esta atividade e os laços por ela promovidos são, mais que tudo, uma forma clara de manifestação da sua Fé e de testemunho concreto do Evangelho.
Esta dimensão torna-se bastante evidente, se pensarmos nas propostas feitas nos últimos anos pelo Papa Francisco, ao considerar a existência de uma Ecologia Integral; de uma Economia, na qual o mais importante deverá ser a justiça social e a igualdade de oportunidades; da necessidade de pensarmos e resolvermos em conjunto – em espírito sinodal – os problemas, não apenas da Igreja, mas de toda a Humanidade.
Os investimentos sustentáveis são respeitadores da natureza, como podemos ver expresso na Encíclica Laudato si, na qual o Santo Padre apela à “conversão ecológica” e à necessidade urgente de “Cuidar da Casa Comum”, propondo uma resposta ousada e ativa à crise ambiental. Mas estes investimentos têm de considerar mais algumas dimensões determinantes, para que o turismo continue a florescer como uma ação humana de encontro e descoberta, do mundo e do outro, dimensões essas que, nas passadas Jornadas Nacionais da Pastoral do Turismo procurámos refletir e destacar, bem como transmitir à Santa Sé. Na mensagem do Dicastério para a Evangelização para este Dia Mundial do Turismo, pela voz do Pro-Prefeito Rino Fisichella1, esta dá sinal de concordância e de as integrar na sua perspetiva futura de trabalho.
Assim sendo, há que enfatizar que a Pastoral do Turismo, enquanto caminho de evangelização, e promotor de um maior conhecimento do outro2, deverá, precisamente, fomentar uma importante reflexão conducente a uma «conceptualização e orientação programática, dando particular relevo ao papel que as pessoas podem desempenhar (…), e à forma como o Turismo religioso e o turismo espiritual se devem posicionar nestas discussões»3. Ou seja:
- aproximando os investigadores e as pastorais, no sentido de aprofundar «dimensões mais cognitivas», que facilitem «a reflexão e desenvolvimento interior das pessoas, para a comunicação entre elas, e como uma porta de entrada para a fé»4;
- aproximando os recursos humanos que estão envolvidos no seu funcionamento e que facilitam o acolhimento e a hospitalidade (referida por Fisichella5 como «o acolhimento cristão»), ambos com um papel fundamental no estabelecimento de um sentido de fraternidade, de diálogo e de paz;
- aproximando a Igreja de novas formas de organização e gestão do património a seu cargo, desenvolvendo modelos de negócio e de governança compatíveis com a sustentabilidade e as práticas próprias do turismo religioso/espiritual, reconhecendo, sempre, que «o valor e a importância da arte, da cultura e da sua preservação como forma de conhecer Deus e de manter vivas as raízes cristãs»6, dinamizando o respeito pela identidade e preservação, mas também pelo trabalho e pelos trabalhadores, melhoram a qualidade da oferta e da vida de todos;
- aproximando as comunidades locais, as pastorais diocesanas e equacionando soluções de «cooperação interinstitucional», bem como a «criação de redes e pontes»7 entre todas as organizações ligadas ao turismo.
Rui Miguel Nabeiro, atual líder da Delta e neto do fundador da empresa (tida como referência na área da sustentabilidade), dizia numa entrevista ao Expresso, que «a sustentabilidade não é só fazer doações, é criar um negócio que seja gerador de riqueza para a comunidade» e que «não podemos ficar com os grãos todos na mão. O outro também tem de ficar feliz»8.
«A felicidade está apenas no amar e no deixar-se amar»9, dizia o Papa Francisco. Na verdade, a Pastoral do Turismo é apenas um instrumento ao serviço dessa arte de amar, amar sem limites, procurando estradas que nos levem ao cuidado da casa comum, centrarmo-nos no valor da Criação, qualquer que ela seja, centrando-nos na felicidade e na harmonia, no equilíbrio para um total investimento verde.
8 de setembro de 2023
Memória litúrgica da Natividade de Nossa Senhora
Pe. Miguel Lopes-Neto
Diretor da PTP
NOTAS:
- Fisichella, Rino (2023). MENSAJE 44ª JORNADA MUNDIAL DEL TURISMO, “Turismo e inversiones verdes”. Dicasterio para la Evangelización, Sección para las Cuestiones Fundamentales de la Evangelización en el Mundo, Vaticano, http://www.evangelizatio.va/content/pcpne/es/attivita/Pastorale-del-Turismo/44-MessaggioTurismo.html
- Neto, Miguel-Lopes (2022). Proposta de mensagem para o Dia Mundial do Turismo. Pastoral do Turismo – Portugal, https://www.pastoraldoturismo.pt/proposta–de–mensagem–para-o-dia–mundial–doturismo–2022/
- Costa, Carlos e Pereira, Varico (no prelo). V Jornadas da Pastoral do Turismo. A caminho de uma Pastoral “Laudato Si”, Conclusões.
- Costa, Carlos e Pereira, Varico (no prelo). op. cit.
- Fisichella, Rino (2023). op. cit.
- Fisichella, Rino (2023). op. cit.
- Costa, Carlos e Pereira, Varico (no prelo). op. cit.
- Cotrim, Teresa (2023). Podcast Ser ou não ser – Rui Miguel Nabeiro. Expresso,
[1] Centofanti, Sergio (2019). Papa Francisco e o caminho da verdadeira felicidade. Vatican News, https://www.vaticannews.va/pt/papa/news/2019–03/paap–francisco–alegria–decalogo.html