JUNHO 2020

   Na Newsletter do mês de Junho pretendemos dar voz aos profissionais de turismo, para que partilhem connosco, na primeira pessoa, as suas dificuldades e esperanças na vivência das suas atividades, em tempo de pandemia. Dificuldades presentes e esperanças para o futuro, no curto, médio e longo prazo das suas atividades. Agradecemos o contributo de três profissionais, de áreas distintas: Agência de Viagens (Afonso Carreira), Hotelaria (Alexandre Marto) e Associação Portuguesa de Guias-Intérpretes (Cristina Leal).

   O momento presente confronta-nos com a nossa fragilidade humana, exigindo de nós uma resposta – física, psicológica, afetiva, mas também espiritual. Com efeito, estes tempos de fragilidade colocam-nos diante da dicotomia certeza / incerteza; segurança da vida / insegurança; pleno domínio do mundo / dependência da criação; capacidade científica / incapacidade imediata de resposta; atitude permanente de otimismo no sucesso humano / reserva e consciência da fragilidade; enfim… um sem número de questões antagónicas que sobrevêm ao espírito humano, particularmente em tempos de dificuldade. Se urge encontrar resposta científica para a pandemia que vivemos, urge também cuidar das feridas psicológicas e emocionais que esta comporta. Sem qualquer pretensão proselitista, mas conscientes da dimensão espiritual e transcendente da vida humana, sabemos que a resposta espiritual se torna mais aguda nestas horas, na busca do sentido da vida e de uma esperança que nos anime nas vicissitudes da história. Neste sentido, se toda a pastoral deve cuidar desta atenção às feridas pessoais e sociais, provocadas por este mal que nos aflige, a pastoral do turismo comunga do mesmo desígnio, propondo espaços e vivências que sejam de catarse, de renovação da esperança e de redescoberta do sentido profundo da existência humana – espaços de fé, santuários ou outros, onde o homem se reencontre consigo, com a compreensão de si e, muito particularmente, com o amor sempre fiel de Deus. Não estranhamos, por isso que «a espiritualidade possa ganhar aqui um novo sentido», como afirma Afonso Carreira; ou que o turismo religioso tenha, nestes dias de dificuldade, uma «antecâmara de dias gloriosos», na afirmação de Alexandre Marto. Sem nunca descuidarmos, também, o compromisso de partilha e de atenção de uns para com os outros, especialmente em tempos de crise e de possíveis dificuldades económicas, como nos deixa perceber a Cristina Leal, no seu testemunho.

   Nesta Newsletter apresentamos, ainda, duas notícias: uma sobre a Rota dos Pastorinhos de Fátima, recentemente inaugurada; e uma outra sobre a recente mensagem da Obra Nacional da Pastoral do Turismo para a época balnear, entretanto iniciada.

   Agradecemos à Rosário Frazão e à Natalina Ferreira os seus contributos para esta Newsletter.

   A todos Saúde e Paz!
   Pe. Carlos Godinho
   Diretor da ONPT

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Partilha de dificuldades e esperanças nesta época de pandemia!

Afonso Carreira, 
Business Development Manager, 
Verde Pino

A pandemia, provocada pela Covid-19, colocou todas agências de viagens, designadamente aquelas que se dedicam à operação de grupos organizados, numa situação de ausência total de atividade.

Mesmo que a situação possa melhorar um pouco após a reabertura da generalidade das fronteiras, prevê-se que, pelo menos até ao surgimento de uma vacina eficaz, a circulação internacional de grupos turísticos organizados deva ser bastante reduzida e com uma operacionalidade extremamente complexa. Para esta nova e difícil realidade contribuem fatores como o medo instalado nas populações, as restrições sanitárias a que estarão obrigados prestadores de serviços turísticos como hotéis, restaurantes, autocarros e a diminuição da capacidade aquisitiva dos consumidores. Deveremos conviver com esta situação durante os próximos meses, período durante o qual a compra de um pacote de viagem passará a ocupar os lugares mais baixos na lista de prioridades de consumo das famílias.

Sendo esta a situação que afetará as viagens turísticas de uma forma geral, poderá acontecer que determinados “nichos” desta atividade possam ter um comportamento distinto. Assim poderá acontecer com as Peregrinações ou, adotando uma designação mais comercial, com todas as viagens marcadas pela sua função religiosa. Na verdade, este tipo de viagens tem uma importância e uma prioridade nas decisões de consumo de quem nelas está interessado muito maiores do que qualquer outro tipo de viagem, designadamente de lazer. A vontade tornada necessidade de peregrinar até santuários ou lugares sagrados, nos primeiros momentos em que surja essa possibilidade, poderá ser uma realidade para a qual os operadores de Turismo Religioso devem estar preparados. A fé das pessoas, a urgência no agradecimento, a necessidade de oração coletiva, são motivações que deverão ser suficientes para ultrapassar medos e ganhar confiança. Saibamos nós, operadores neste mercado de Turismo Religioso, estar preparados para adaptar as “novas” peregrinações à “nova realidade”, particularmente ao nível dos cuidados sanitários acrescidos, nunca esquecendo que a motivação fundamental de viagem dos nossos clientes não será modificada pela pandemia: PEREGRINAR.

É nesta adaptação que estamos a trabalhar e é com esta esperança que estamos a viver o momento presente.

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Alexandre Marto, 
CEO, Fátima Hotels Group

A emergência da doença catapulta-nos para um local em que refletimos sobre a finitude da vida. Nesse sentido, esta crise é um convite para uma caminhada de reflexão, à descoberta do espiritual e de Deus - numa palavra à peregrinação. O turismo religioso tem, neste momento duro, uma antecâmara de dias radiosos.

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Cristina Leal, 
PRESIDENTE AGIC, 
AGIC- Associação Portuguesa dos Guias-Intérpretes e Correios de Turismo

   A Associação Portuguesa dos Guias-Intérpretes e Correios de Turismo –AGIC, é uma associação profissional que representa prestadores de serviços de informação turística, sendo Guias-Intérpretes (norma europeia EN 18513 2003) as pessoas que guiam visitantes na língua da sua escolha e interpretam o património cultural e natural na área específica para a qual possuem qualificações e/ou licenças, emitidos e/ou reconhecidos pelas autoridades competentes.

   Os guias-intérpretes certificados devem, portanto, saber interpretar a cultura da região visitada e o modo de vida dos seus habitantes, de modo a facilitar a sua compreensão pelos visitantes. Têm um papel relevante, por um lado, na promoção do património cultural e natural do seu país e, por outro, serem garantes da sua sustentabilidade fornecendo informações sobre a sua importância e vulnerabilidade.

   Pela especificidade da sua profissão, que depende quase na totalidade de conjunturas internacionais, como a abertura de fronteiras, ligações aéreas intra-europeias e transcontinentais, viagens de cruzeiros, fluviais ou oceânicos, os guias-intérpretes foram duramente afetados pela crise sanitária originada pela COVID-19, com cancelamentos imediatos entre os 85 e os 100 % dos serviços programados e, apesar da terceira fase de desconfinamento decretada pelo Governo a 01 de Junho, os guias permanecem, até esta data, sem previsão de alterações substantivas, sem marcações de trabalho e, consequentemente, sem rendimentos próprios, desde Março, pelo menos, até Agosto, inclusive.

   Ao registo acima, soma-se a sazonalidade, não havendo no geral viagens organizadas entre os meses de Novembro e Março, pelo que iriam recomeçar o seu trabalho quando a pandemia se declarou, e o facto da programação deste tipo de viagens carecer de tempo de promoção e vendas, não sendo portanto expectável uma retoma da sua atividade antes da Páscoa de 2021. Resta a expectativa, ainda muito incerta, de algum trabalho para os meses de Setembro e Outubro, em especial dos mercados espanhol e francês.

   Os guias-intérpretes sócios da AGIC, e segundo um inquérito interno, têm ocupado o seu tempo disponível dedicando-se à valorização profissional através da atualização de conhecimentos e criando mecanismos que lhes permitam o relançamento no mercado de uma forma eficaz, onde se inclui a formação Clean and Safe do Turismo de Portugal, especialmente desenhada para os guias. Foram alvo dos mesmos apoios da generalidade da população com o estatuto de trabalhador independente, mas carecem de continuidade devido à especificidade da profissão. Mesmo tendo aforrado durante os anos passados, para a maioria não será suficiente e será muito difícil a sobrevivência sem rendimentos nem apoios.

   O Estado e a sociedade portuguesa, bem assim como as empresas do setor, têm, a nosso ver, todo o interesse em que estes profissionais não abandonem as suas carreiras, dispersando-se por outros sectores, pelo capital de conhecimento e experiência acumulados ao longo de décadas, que muito contribuíram para o sucesso das viagens organizadas.  

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NOTÍCIAS

Rota dos Pastorinhos inaugurada

   Os peregrinos e os turistas podem começar a descobrir e a percorrer uma rota nova e antiga. Ocasião para um envolvimento numa história centenária e usufruir de belo repasto cultural e paisagístico.

   A Rota dos Pastorinhos, percurso interpretativo em torno da vida dos pastorinhos de Fátima que passa por vários pontos turísticos e culturais do concelho de Ourém, foi inaugurada, no passado dia 20 de junho. Tem início no santuário de Fátima e termina na antiga casa do pároco do Olival.

Esta rota apresenta um percurso baseado em dez lugares que marcaram a história dos três videntes de Fátima e as suas vivências no concelho de Ourém.

Ao percorrer a Rota dos Pastorinhos, os visitantes encontrarão painéis interpretativos e outros elementos onde poderão obter informações sobre a vida dos pastorinhos e sobre os vários recursos turísticos existentes no concelho de Ourém.

A paróquia do Olival louva a iniciativa e informa que está a estudar propostas para dignificar e valorizar mais os dois locais muito ligados ao fenómeno de Fátima. Os pastorinhos estiveram por diversas vezes em terra olivalense. Foram acolhidos e pernoitaram na casa da senhora Emília, no lugar da Soutaria (habitação que foi convertida em capela), como se diz no livro das “Memórias da irmã Lúcia”; também se conta a realização de uma cura (milagre), e estiveram no centro do Olival, na casa do padre Faustino Ferreira para interrogatórios, na condição de vigário da Vigararia.

A Rota dos Pastorinhos poderá ser conhecida em: turismo.ourem.pt/index.php/rotas-pastorinhos

P. Davide Gonçalves

http://www.leiria-fatima.pt

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NOTA DA OBRA NACIONAL DA PASTORAL DO TURISMO PARA A ÉPOCA BALNEAR DE 2020

Turismo em tempo de pandemia!

1. Na atual situação pandémica, em que nos encontramos, a atividade turística foi das que mais sofreu em termos de perdas, de entre todas as atividades económicas e sociais, devido às suas características, atendendo a que ela assenta a sua ação na mobilidade de pessoas e na consequente utilização da diversidade de serviços que lhe correspondem. O confinamento, em vários países; o fecho de fronteiras; a imobilização de meios de transporte, particularmente o transporte aéreo; o encerramento de monumentos, de museus, espaços de lazer e de recreação; o teletrabalho; o cancelamento de múltiplas atividades culturais, recreativas e mesmo de grandes congressos profissionais; obrigou a uma mobilidade reduzidíssima, assente apenas nas atividades essenciais, o que motivou uma quase estagnação, que todos conhecemos, nos vários setores desta atividade humana e económica. Ora, vivendo o turismo desta mobilidade de pessoas e das suas múltiplas atividades, o setor confrontou-se, quase de um momento para o outro, com uma suspensão generalizada de toda a sua atividade, com as consequências económicas e sociais que todos conhecemos. Portugal, que até ao final de fevereiro continuava a crescer percentualmente na atividade turística, por comparação com períodos homólogos, fazendo depender muito do seu crescimento económico desta atividade, vê-se abruptamente privado dos seus recursos, com as consequências económicas, sociais e laborais que daí resultaram e que ainda terão de ser contabilizadas num futuro próximo.

Não obstante, a nossa resposta foi rápida e criativa. Pese embora a incerteza sobre o futuro do turismo, a curto e médio prazo, diversas instituições do setor, tendo à cabeça a Secretaria de Estado, o Turismo de Portugal e a Confederação do Turismo de Portugal, tomaram medidas adequadas à salvaguarda, reorientação e perspetiva de retoma da atividade no setor. Sabemos, contudo, que as consequências são inevitáveis: para o país, para as empresas e para as pessoas, especialmente para aquelas que dependem laboralmente do dinamismo da atividade turística; algumas delas, inclusive, com vínculos laborais muito precários, quer pelo facto de serem prestadores de serviços, quer pela sazonalidade, que ainda persiste nalguma desta atividade. Sem deixarmos de considerar, também, as demais atividades económicas e sociais indiretas que beneficiam da atividade turística e que sofreram igualmente perdas muito significativas.

O tempo que se avizinha, cheio de incertezas, tem de continuar a exigir resiliência, com recurso às medidas de apoio público necessárias; criatividade; reorganização; e, sobretudo, uma grande esperança na retoma, certamente mais consciente, articulada com outras áreas do desenvolvimento económico e social, mais sustentável do ponto de vista ambiental, e mais diversificado na oferta de novos destinos, desconcentrando os produtos e territórios a privilegiar. Também assim, hoje, como noutros períodos de crise, ainda que de causas distintas, se podem abrir novas perspetivas de investimento e de diversificação de atividades neste setor do turismo.

 

2. Desde logo, esta paragem abrupta fez-nos olhar de um modo renovado para as possibilidades do Turismo em Portugal: os seus ativos, que permanecem e devem ser valorizados; os polos diversificados de atividade e a possibilidade de desconcentrar a oferta turística; a urgência de continuar a implementar medidas de qualidade – sanitária e ambiental; e a segurança, cujo conceito agora se alarga neste setor da atividade, como nos demais setores.

 

(Nota disponível integralmente em: http://www.pastoraldoturismo.pt )

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